segunda-feira, 19 de outubro de 2015

“Quando se chega aqui, ou se diz tudo, ou mais vale ficar calado”

Astronomia, que Mário Cláudio lança hoje no Escritaria, em Penafiel, é ao mesmo tempo um romance complexo e inovador e um desassombrado e minucioso auto-retrato, no qual o escritor se expõe de um modo raramente visto na ficção portuguesa.
Conta a infância sem se poupar a nenhum embaraço, das pequenas crueldades que todas as crianças cometem às ingénuas experiências eróticas com criadas e rapazes. Narra abertamente a longa relação amorosa que iniciou aos 25 anos com um inglês que não nomeia no livro, mas que é uma das pessoas que fez questão de ter ao seu lado na homenagem que o festival Escritaria lhe está a prestar em Penafiel, descreve a sua desolada passagem pelo funcionalismo público, confessa as ânsias juvenis de reconhecimento nos anos em que se dava a conhecer ao mundo como escritor, descreve com demorada minúcia os seus rituais de velhice, a ponto de nos mostrar como procede ao ensaboamento de orelhas e sovacos, para já não falar das “nádegas e respectivas adjacências ocultas”. Talvez nenhum romancista português se tenha exposto tanto como Mário Cláudio neste Astronomia, mesmo se ele próprio vai avisando que o livro, “como todos os retratos, também é mentiroso”

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