sábado, 4 de outubro de 2014

Ler o que nunca foi escrito




Este livro, anunciado como a edição de um romance inacabado do espólio de José Saramago, é um híbrido. Integra nove notas breves que o escritor escreveu enquanto trabalhava nele, numa altura em que já estava doente, e inclui ainda um texto do seu biógrafo, Fernando Gómez Aguilera, para além de outro do jornalista italiano Roberto Saviano, conhecido pela sua luta contra a Máfia, mais uma série de desenhos de Günter Grass. Exceptuando as notas, plenamente justificáveis, para quê esta acumulação de materiais a acompanhar o texto inédito, que o sufocam e desviam completamente no momento em que ele vai chegar pela primeira vez aos leitores? É fácil adivinhar: porque as vinte e duas páginas que Saramago escreveu para aquele que deveria ser o seu último romance é algo demasiado inacabado para interessar ao leitor comum. Para não o confinar ao universo estrito dos especialistas e curiosos, o editor fabricou um simulacro.

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