domingo, 14 de junho de 2015

Cinema: Portugal visto do tapete voador de Miguel Gomes




Na sua história do cinema “com um S”, Godard percorre “todas as histórias que existirão, que existiriam, que existiram” para interrogar “o poder da Babilónia” face à “actualidade da história” e à “história da actualidade”. Aí se sustenta que o cinema terá sido testemunha impotente do seu tempo, enquanto a fábrica-cinema produzia um dilúvio de histórias, senão mesmo imagens do horror, porque era necessário sonhar: eis a paradoxal “regra do jogo”.
A história que Godard nos conta é a de um cinema que sucumbe ao mesmo tempo que cumpre o seu dever de memória. Contrariando as expectativas, o cinema não morreu e, sem esquecer-se do passado, combate o esquecimento do presente.
Este poderia ser o ponto de partida das Mil e Uma Noites, o novo filme de Miguel Gomes que estreará em Portugal em Outubro. Usando como pretexto a mecânica narrativa dos contos orientais, Gomes reuniu uma equipa de jornalistas encarregada de seguir a actualidade da imprensa e seleccionar acontecimentos que seriam investigados no terreno e reescritos pelos argumentistas. Com toda a equipa técnica, artística e de produção sempre de piquete, a rodagem podia, então, começar, sabendo-se apenas que a sequência do guião dependia do que estava para acontecer. Miguel Gomes assumiu, portanto, o leme de um filme à deriva entre as vagas da realidade e a tempestade dos média, uma e outra afrontadas com as armas da ficção.

Sem comentários: