quem por esta semana passou na Rua de José Falcão, no Porto, podia assistir à azáfama: caixas de livros empilhadas eram levadas para o interior de camiões. Escrevia-se o último capítulo da Livraria Leitura. O mítico espaço fechou e um vazio incomensurável fica por preencher. Como uma cicatriz na cidade. Insanável. No ano em que comemoraria 50 anos de uma existência dedicada à proliferação do pensamento e à produção de massa crítica, o momento é de “luto”. O Porto diz adeus à Leitura, onde foram escritas páginas douradas da cultura portuguesa da segunda metade do século XX..
O desfecho é o resultado da insolvência da empresa Bulhosa Livreiros, decretada a 15 de janeiro pelo Tribunal Judicial da Comarca de Braga. Inaugurada em setembro de 1968, pelo livreiro Fernando Fernandes e pelo editor José Carvalho Branco, a Leitura tornou-se numa das mais emblemáticas livrarias da Invicta, adquirindo um significado cultural inestimável a nível regional e nacional. Destacava-se pelo vasto catálogo, onde constavam nas prateleiras aproximadamente 120 mil obras.
Durante décadas, constituiu um baluarte de resistência durante os anos de ditadura, comercializando livros proibidos pela censura, e serviu de “casa” para o pensamento, tornando-se num local de passagem obrigatória para ávidos e ilustres leitores, como Mário Soares, Marcelo Rebelo Sousa, Manuel Alegre, o Nobel José Saramago, os também escritores Mário Cláudio e Agustina Bessa-Luís, a poetisa Ana Luísa Amaral, o professor Óscar Lopes ou o pintor Armando Alves - um dos “quatro vintes”, juntamente com José Rodrigues, Costa Pinheiro e Ângelo de Sousa. A lista poderia prolongar-se, porque muitas foram as figuras da vida portuguesa que por ali passaram, sempre em busca de raridades, impossíveis de conseguir noutros locais.
Expresso
Sem comentários:
Enviar um comentário