sexta-feira, 16 de agosto de 2013
Cinema: As muitas vidas de Paulo Rocha
Homenagem
em Locarno, que exibe em estreia mundial Se
Eu Fosse Ladrão... Roubava. Por Luís
Miguel Oliveira
Se Eu Fosse Ladrão... Roubava, o
derradeiro filme de Paulo Rocha, vai conhecer a sua primeira apresentação
mundial no Festival de Locarno. A estreia do topus de Rocha, que morreu em Dezembro, aos 77 anos, é um ponto
alto do festival, e convém frisar que ela sucede no quadro duma homenagem ao
cineasta português, que contempla ainda a projecção dos seus dois primeiros
filmes, Mudar de Vida (1966) e Os Verdes Anos (1963), a primeira obra
de Rocha e um título nuclear no lançamento do Cinema Novo português, que ali
mesmo em Locarno alcançou, em 1964, uma primeira grande distinção
internacional, com o prémio de Melhor Primeira Obra.
Se
eu Fosse Ladrão... Roubava foi concebido como um projecto que implicava uma
súmula, artística e biográfica. Talvez não fosse, nesse momento inicial, um
projecto de "filme-testamento", talvez Paulo Rocha não tenha pensado
nele como a sua "última palavra". Mas entre as dificuldades para
concretizar o projecto, e os seus problemas de saúde, parece nítido que Rocha
intuiu que este seria o seu último filme, deixou-o ensopar-se nesse prenúncio.
Ficou, de facto, como o testamento de Paulo Rocha, até numa perspectiva de
"revisão" da sua obra, mas é igualmente um filme marcado pela morte.
E quando chegam a última cena e as últimas imagens é difícil não pensar que era
da sua própria morte que Rocha falava, e para que se preparava: dois vultos
negros transportam um cadáver amortalhado através dum bosque, e a voz off sussurra qualquer coisa sobre
"não ter medo". É uma coisa poderosíssima e comoventíssima, e como
fecho de obra só terá paralelo, no cinema português, com o plano final do Vai e Vem de João César Monteiro, outro
filme "de despedida", outro filme com uma dimensão post-mortem.
Etiquetas:
Cinema Português
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